O levantamento divulgado pela Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul traz um dado impactante e que, ao mesmo tempo, não surpreende: em 42% dos casos de feminicídio analisados a motivação para o crime foi a não aceitação do fim do relacionamento por parte do autor. Se acrescentarmos os casos (18%) em que o ciúme é apontado, chegaremos a um total de 60% dos feminicídios sendo cometidos em razão do sentimento de posse do autor em relação à vítima. 


Por que alguns homens não respeitam a decisão da mulher de romper a relação?
São homens que se acham ‘donos’ da mulher, com direito de impor suas vontades e de ‘puni-las’ e ‘discipliná-las’ quando elas não agem conforme eles desejam ou determinam. Essa noção tem sua origem na forma como a sociedade dá mais valor ao masculino, o que por sua vez se reflete na forma de educar meninos e meninas. Enquanto os meninos são incentivados a valorizar a agressividade, a força física, a ação, a dominação e a satisfazer seus desejos, inclusive os sexuais, as meninas são valorizadas pela beleza, delicadeza, sedução, submissão, dependência, sentimentalismo, passividade e o cuidado com os outros.


Se as características do papel masculino são mais valorizadas do que as do papel feminino, isso faz com que muitos homens se sintam superiores às mulheres e, portanto, com direito de tratá-las como sua propriedade, obrigando-as a se submeterem a suas ordens e desejos – entre eles o de manter-se em um relacionamento que para elas acabou. Da mesma forma, como “proprietários”, consideram-se também senhores da vida e da morte delas.


Por isso é fundamental educar as crianças e toda a sociedade para a desnaturalização da desigualdade de gênero e da cultura da violência contra as mulheres, que se baseiam nas noções errôneas da superioridade masculina e de que se pode resolver qualquer conflito ou contrariedade por meio da violência. O diálogo é sempre o melhor caminho. E não se trata de “aceitar ou não”, mas sim de respeitar a decisão da mulher. Não é não!


Texto: Marisa Sanematsu - jornalista, diretora de conteúdo do Instituto Patrícia Galvão e editora dos portais da Agência Patrícia Galvão e da Campanha Compromisso e Atitude pela Lei Maria da Penha.